6 de janeiro de 2008

Morreu Pacheco. O Último dos malditos


Luís Pacheco

Ontem morreu Luís Pacheco!

O que é que eu posso dizer de Luís Pacheco?

Muita coisa! Mas o melhor é fazer minhas estas palavras publicadas no Amnésia, com o qual concordo inteiramente

"O Luís Pacheco é provavelmente o maior filho da Puta, a pessoa mais corrosiva, mais intratável que há, mas eu gosto dele. Não sei porque mas gosto dele. O Luís tem a capacidade de dizer o que pensa, de dizer mesmo tudo o que pensa, mesmo o que não poderia dizer [...]"

Mesmo o que não poderia dizer … (Alguns exemplos)

[…]o Namora é abaixo de cão, nem é abaixo de Namora, é abaixo de cão[…]

[…]o Saramago[…] Eu comprei o Evangelho, ele costumava-me mandar, mas eu comprei: li duas páginas e depois fui ver que faltavam ainda 500 ou 400 e não li mais nada[…]

[…]A Natália Correia é uma devassa, vocês ponham isso que ela fica toda zangada […] «Ó sua maluca, você não é uma libertina, você é uma devassa», é uma estragadona que não respeita pai nem mãe, vai meter-se com o irmão de uma mulher minha, com um tio deste, quando eu estava preso no Limoeiro. Ela meteu-se com uma mulher minha. Quer dizer, abusou da situação de eu estar preso para aproveitar uma rapariga que estava lá em casa por caridade […]

[…]José Cardoso Pires[…] Vocês leram o Hóspede de Job? Ele dedica «ao meu irmão António Nuno», como se lhe tivesse um grande amor. Ele dava porrada no irmão! E depois falava dele como se fosse uma vítima da guerra. Não era nada, era maluco[...]

[…] Agora esta Pedrosa (Inês) é uma estúpida[…] Deve ser muito estúpida. Li umas coisas dela horrorosas, completamente idiotas[…]

Excertos da entrevista de Luis Pacheco a Carlos Quevedo e a Rui Zink, publicada na Revista K em 1992

Biografia

Vagabundo militante durante toda a vida, Luiz Pacheco começa por criar a histórica editora Contraponto em 1950. Sob este selo saem, nos anos seguintes, títulos de Herberto Helder, Mário Cesariny, José Gomes Ferreira, Vergílio Ferreira, José Cardoso Pires, Natália Correia e António Maria Lisboa, entre outros. É um editor fundamental no seu tempo, muito ligado ao movimento surrealista, mas ao qual não se prende.

É escritor dos melhores: certeiro, escorreito, vivido e profundo conhecedor do mundo literário. Em 1959 publica a Carta-Sincera a José Gomes Ferreira, escrita em 1953, em A Antologia em 1958, organizada por Cesariny. O Teodolito é feito público em 1962. Depois seguem-se memoráveis textos da literatura portuguesa como Comunidade (1964), Crítica de CircunstânciaO Libertino Passeia por Braga, a Idolátrica, o Seu Esplendor (1970), Exercícios de EstiloLiteratura Comestível (1972) e Pacheco versus Cesariny (1974).

Desentendimentos circunstanciais com Mário Cesariny levam à publicação do Jornal do Gato, em 1974, pela mão do poeta surrealista, que compila um conjunto de cartas de Luiz Pacheco a diversos interlocutores, para no final lhe responder publicamente. Foi Pacheco a abrir os precedentes, com a publicação de Pacheco versus Cesariny. Quando entrevista a Carlos Quevedo" st="on">em entrevista a Carlos Quevedo e a Rui Zink, em 1992, lhe perguntam porquê, responde simples: «Isso sempre foi um hábito meu, dar o nome aos bois.» (1966), (1971),

Escreve e publica panfletos e pequenos contos, dos quais, o primeiro de todos, História Antiga e Conhecida, primariamente publicado em 1946 num volume com vários autores, é recuperado em 2002 sob a designação Os doutores, a salvação e o menino Jesus. De 1981, lembramos O Caso das Criancinhas Desaparecidas. Nos panfletos estão títulos como Crueldade Testicular (1960) ou A PIDE nunca existiu (1976).

Na poesia, campo onde poderia ter sido, a querer, um supra-Pessoa, afirmou o próprio, pode ser lido na Antologia da poesia erótica e satírica (1966), organizada por Natália Correia. Quis ser crítico feroz, denunciando a desonestidade intelectual. Vítima mediática dessa vontade foi Fernando Namora, a quem Luiz Pacheco acusou de plagiar algumas passagens de Aparição em Domingo à Tarde (1961). (1959), de Vergílio Ferreira,

Em 2005, foi recuperado pela D. Quixote, que publicou Diário remendado 1971-1975, e pela Quasi, que edita Cartas ao léu: 24 cartas a João Carlos Raposo Nunes. Já em 2007, a RTP2 transmite o documentário Mais um dia de noite, sobre a vida e a obra de Luiz Pacheco. Em Novembro de 2007, a Perve Galeria monta uma edição especial e limitada de Comunidade com serigrafias de Cruzeiro Seixas, para assinalar o primeiro ano após a morte de Cesariny.

Quanto a 2008, a Tinta da China deve editar, ainda este mês, as últimas entrevistas concedidas pelo escritor, compiladas por João Pedro George, que prepara ainda a tese de doutoramento sobre o escritor, editor, tradutor e crítico literário. E espírito livre.

Ontem à noite, Luiz Pacheco, nascido a 7 de Maio de 1925, em Lisboa, a contar 82 anos, chegou já sem vida ao Hospital do Montijo. O óbito do escritor foi registado às 22h17, adianta a Lusa. O resto anda por aí, em bibliotecas e nas bocas dos amigos e das entrevistas nas revistas e nos jornais, também disseminadas pela Internet

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