11 de novembro de 2005

Assim vai a Justiça em Portugal (I)

Fazendo fé na notícia divulgada pelo Diário de Notícias. Os meritíssimos Juízes desembargadores do Tribunal da relação de Lisboa, decidiram despronunciar o “cidadão” Paulo Pedroso, dos inúmeros crimes de pedofilia e abuso sexual de menores, devido a:

"em tribunal penal (...) exige-se o afastamento de toda a dúvida sobre os factos e as respectivas autorias e culpabilidades". Percorrendo o processo, os desembargadores depararam-se, segundo dizem, com "uma dupla e insanável dúvida quanto à veracidade das imputações feitas ao arguido e quanto à pretendida inocência deste". E, citando Figueiredo Dias, defendem que "avançar para a pronúncia (julgamento), com as ditas incertezas", constituiria "um ataque ao bom nome e reputação do acusado".

Os desembargadores da Relação de Lisboa consideraram o reconhecimento fotográfico feito pelos jovens que dizem ter sido abusados por Paulo Pedroso, ou visto o ex-deputado em casas onde ocorreriam abusos, muito frágeis. Para além de entenderem que as declarações desses jovens são pouco "credíveis", "fantasiosas", "inquinadas"

Até aqui tudo bem! Faz tudo sentido. Mas quem não é versado nestes temas de jurisprudência tem de usar o seu senso comum e comparar com outras sentenças sobre crimes similares.

O Tribunal da Relação de Coimbra publicou em 9 de Março último e assinado pelos meritíssimos juízes Belmiro Andrade, Oliveira Mendes e Elisa Sales, um acórdão relativo a crimes sexuais, do qual destaco as seguintes passagens:

(Tal como os seus colegas de Lisboa, os Desembargadores de Coimbra também se apoiam em Figueiredo Dias)
"[...]É certo que, em matéria de apreciação da prova em julgamento vigora o princípio in dubio pro reo. Significando que “em caso de dúvida razoável” após a produção de prova, tem de actuar em sentido favorável ao arguido - formulação de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Ed. de 1974, pág. 215, citando a doutrina nacional e estrangeira no mesmo sentido[...]"

No entanto não se limitaram à formulação de Figueiredo Dias, velha de 30 anos. Consultaram também outra jurisprudência Nacional e assim:
"[…]A própria dúvida está sujeita a controlo, devendo revelar-se conforme á razão ou racionalmente sindicável, pelo que, não se mostrando racional, tal dúvida não legitima a aplicação do citado principio” - cfr. Ac. STJ de 04.11.1998, BMJ 481º, pág. 265[…]"
e

"[…]Sendo cedo que, como refere o Ac. STJ de 02.02.2004 citado na resposta “Nos crimes sexuais o depoimento da vitima é muitas vezes a única prova directa, por se tratar de factos cometidos na intimidade de um numero limitado de pessoas… podendo, de per si, fundamentar uma condenação» […]"

Os Desembargadores de Coimbra decidem assim o seu acórdão:

[…]Assim, sendo o depoimento da assistente credível e corroborado em aspectos periféricos por outros meios de prova, mantendo-se em audiência, com amplo contraditório e com base na imediação, a condenação do arguido surge como muito provável, ou em todo o caso mais provável que a absolvição. Devendo por isso o ser pronunciado."

Apenas acrescento que o arguido de Coimbra, é um comum mortal, tal como eu ou os meus caros leitores, enquanto que em Lisboa o arguido era um politico com poder e protegido pela maçonaria.
O texto do acórdão de Coimbra pode ser lido na Colectânea de Jurisprudência, Tomo 2, 2005 e na Grande Loja (de onde eu pesquei os excertos).

Assim vai a nossa Justiça, Vergonha de Portugal

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