27 de setembro de 2005

Para lá de Marrakesh

Hoje foi divulgada a noticia que o modelo Marrakesh da Volkswagen vai ser construído nas fábricas de Wolfsburg.

A hipótese de deslocalização da montagem para Portugal, apenas se colocou à mesa das negociações entre a VW e a IG Metall (Sindicato dos metalúrgicos), na prática nunca tal foi pensado, pois os pedidos de componentes foram feitos, considerando a entrega em Wolfsburgo sem qualquer opção, qualquer que esta fosse (Palmela, República Checa, Barcelona, etc).

O facto de o “papão” escolhido ser a fábrica de Palmela, foi apenas por ser o “Papão mais credível”, pois é uma fábrica que neste momento se encontra em baixa produção motivada pelo fim de um velho projecto e o arranque de um novo, situação que as restantes fábricas da VW não se encontram.

Esta notícia foi objecto de um grande alarido, hoje de manhã na TSF, em que participou o conhecido jornalista/economista Peres Metelo.
O que é relevante na notícia, não é facto de o modelo não vir para Portugal, o que é relevante, aliás excepcionalmente relevante é o facto de a VW ter vergado totalmente a I.G. Metall, que é nem mais nem menos que o sindicato mais poderoso da Alemanha, e provavelmente da Europa.
Com estas negociações a VW conseguiu apenas isto:
Redução de Salários;
Fim das 6 semanas de férias, voltou a ser 4 semanas;
Fim da Semana de 4 dias (32 horas), voltaram a trabalhar as 40 horas semanais;
Esta foi a primeira derrota do sindicato na Alemanha do pós-guerra. Este facto é desde já histórico. As consequências serão enormes, pois agora todos os sindicatos alemães estarão sob fogo dos restantes grupos económicos, no sentido de conseguirem as mesmas condições que a VW conseguiu.
Quem como eu, trabalha nesta indústria sabe que existe uma lei não escrita que reza assim:
A VW nunca coloca a montagem de um modelo fora de Wolfsburg, sem a capacidade desta última estar tomada a 100%.

O que é patético é que Peres Metelo, hoje de manhã na TSF, debitou apenas a sua enorme ignorância sobre economia em geral e a indústria automóvel em particular. A sua dissertação sobre o peso que os 1000 € por viatura tinham no custo desta, revela o total desconhecimento da estrutura de custos de um automóvel, onde os custos de desenvolvimento representam mais de 50% do seu custo total de produção. Pelo que os 1000 euros são especialmente relevantes numa indústria que discute o preço de cada componente ao cêntimo. Para se ter uma ideia, 1000 € representam aproximadamente, o custo de 2 motores 1.9 TDI.
Mais, Peres Metelo nunca leu Sun Tzu. Se o tivesse lido saberia que quando se está em posição vencedora tem de se abrir uma porta para a fuga do inimigo, e ao mesmo tempo fazer com que este não perca a face. Assim a I.G. Metall, a coberto da deslocalização para Palmela, pode salvar a face perante os seus associados transformando a estrondosa derrota em “salvamento” de 1000 postos de trabalho (que nunca estiveram em causa) em Wolfsburg.

Hoje de manhã quem ouviu a TSF, esteve a ouvir dois Jornalistas que estavam completamente "para lá de Marrakesh".

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