26 de março de 2006

Recordando: Hospital de Arroios

Este é o estado actual do Hospital de Arroios, à praça do Chile, em adiantado estado de degradação, aguarda andrajoso, o camartelo que o transformará em mais um condomínio privado, conforme já foi referido aqui e aqui.

Antigo convento e colégio da Companhia de Jesus, transformado em Hospital em 1890, o Hospital de Arroios, dependendo do Hospital dos Capuchos foi, entre 1919 e 1925, o Hospital que acolheu e tratou milhares de militares mutilados e feridos na 1ª Guerra Mundial, com graves problemas de locomoção.

O meu avô Rogério (2º a contar da esquerda na fila de cima), ferido em combate a 18 de Abril de 1918 foi, apesar de tudo, bafejado pela sorte. Após 0 dia 9 de Abril, a estrutura militar Portuguesa tinha deixado de existir e com ela os hospitais de campanha, que pouco mais eram que açougues infectados com febre tifoíde, onde os médicos tentavam salvar vidas sem terem os mínimos meios para o fazer, por isso o meu avô, foi assistido num Hospital Canadiano e na rectaguarda, a sua perna foi salva graças a um enxerto ósseo colocado por um cirurgião Inglês.

Entre 1919 e 1923, o Hospital de Arroios foi a sua casa. Nele consolidou o enxerto ósseo, reaprendeu a andar e assim voltou à vida activa, carregando no seu andar e para toda a vida, a lembrança daquele dia de primavera de 1918.

Para alêm da medicina, no Hospital de Arroios preparavam-se os mutilados para o seu díficil retorno à vida activa. A importância dada aos trabalhos agrícolas refectia duas situações. A importância que tal actividade tinha na estrutura económica de então

e o simples facto de que os soldados que aguentaram a lama na Flandres, que se expuseram ao fogo alemão, provinham das camadas mais baixas da sociedade portuguesa, analfabetos e com muito pouca instrução, aguentaram dois anos na lama da Flandres, completamente abandonados e entregues a si mesmos, pois a grande maioria dos oficiais, ou tinha arranjado uma licença só de ida para Portugal, ou passeavam-se nas esplanadas solarengas de Paris-Plage longe do tifo que grassava nas trincheiras.

Assim foi no Hospital de Arroios estes Soldados e Sargentos receberam, após o seu sacrifício, as únicas atenções que a República lhes dignou conceder.

Tentando dar um mínimo conforto a quem durante dois anos viveu num inferno.

Inferno esse, cuja lembrança carregaram no corpo para o resto de suas vidas.

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